Joanna Moura

É publicitária, escritora e produtora de conteúdo. Autora de "E Se Eu Parasse de Comprar? O Ano Que Fiquei Fora da Moda". Escreve sobre moda, consumo consciente e maternidade

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Uniformes olímpicos e a sexualização de corpos femininos

Nike reagiu às críticas afirmando que uniformes apresentados foram apenas uma pequena amostra dos modelos disponíveis

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A Nike revelou nesta semana alguns dos novos uniformes que atletas olímpicos usarão em julho, durante os Jogos em Paris. Entre as peças lançadas pela gigante esportiva estava o uniforme feminino da seleção americana de atletismo: um maiô, com a virilha bem cavada. O modelo foi apresentado lado a lado ao seu equivalente masculino composto de uma camisa regata e uma bermuda.

O lançamento imediatamente gerou um burburinho nas redes, com atletas mulheres expressando seu descontentamento com o design da peça. Uma delas foi a campeã americana de atletismo Lauren Fleshman que questionou a necessidade de seguirmos estabelecendo uniformes altamente sexualizados como sinônimo de padrão de excelência dentro do esporte feminino.

Lauren não foi a única a se incomodar com o maiô, que gerou críticas até entre atletas internacionais como a saltadora inglesa Abigail Irozuru.

"Atletas profissionais devem ser capazes de competir sem dedicar espaço cerebral à vigilância constante do púbis ou à ginástica mental de exibir todas as partes vulneráveis do corpo. Este não é um maiô atlético de elite para atletismo. Este é um traje nascido de forças patriarcais que não são mais bem-vindas ou necessárias para chamar a atenção para o esporte feminino", postou Lauren.

O assunto não é novo dentro do mundo dos esportes. Durante as Olimpíadas de Tóquio, o time feminino de ginástica da Alemanha tomou uma posição contra a sexualização de mulheres no esporte ao adotar o uso de macacões em vez de collants.

A Nike reagiu às críticas afirmando que os uniformes apresentados foram apenas uma pequena amostra dos modelos disponíveis para as equipes. Segundo a empresa, os kits de atletismo incluem cerca de 50 peças e os atletas têm liberdade para escolher o que desejam usar durante as competições.

A atleta alemã Sarah Voss usa macacão nos Jogos de Tóquio, em 2021 - Martin Bureau - 25.jul.2021/AFP

A atleta americana Katie Moon, que competiu no salto com vara das Olimpíadas de Tóquio, reforçou o discurso da Nike, rebatendo o argumento de que o maiô seria sexista e afirmando que atletas mulheres devem poder escolher o que preferem usar sem ter medo do julgamento que podem receber por escolherem esse ou aquele modelo.

"A questão é que TEMOS a escolha do que vestir e, quer nos sintamos melhor num saco de batatas ou num maiô durante as competições, devemos apoiar a autonomia."

Eu entendo o ponto de Katie. Sim, como atletas e mulheres de maneira geral, queremos ter a liberdade para usar o que nos faz bem sem nos preocupar se o que vestimos irá nos colocar ou não em uma situação desconfortável ou potencialmente perigosa (até porque sabemos muito bem que estar completamente coberta nunca foi um empecilho para importunações ou violências sexuais de todo tipo).

Mas a justificativa da Nike e a fala de Katie (que aliás é patrocinada pela Nike desde 2018) falham em captar o cerne do problema. O que há de mais grave e preocupante neste episódio não é a existência de um maiô como uma das muitas opções disponíveis para atletas femininas (é possível questionar se o equivalente está disponível para a seleção masculina. Será que eles também não tem direito à liberdade de escolha?).

O que deve, sim, ser debatido é o recado que a Nike dá ao escolher justamente esse modelo (em detrimento dos outros 49 disponíveis) para ser mostrado ao mundo. Para mim, esse recado é claro: independentemente das nossas escolhas, o desejo que paira no ar é de que nossos corpos sigam à mostra, como patrimônio público.

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